Para Raquel Varela, trabalhadores precisam se unir “em escala global”. Ainda de acordo com a especialista, a esquerda precisa apresentar uma alternativa ao capitalismo

[Escrito por: Igor Carvalho / CUT Nacional]

Raquel Varela, á direita de Maria Aparecida e João Cayres {Foto: Walter Pinto]

Na última quarta-feira (4), o Centro de Documentação e Memória Sindical da CUT (Cedoc) organizou uma conferência com a professora doutora Raquel Varela, pesquisadora do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa, onde coordena o grupo Estudos do Trabalho e dos Conflitos Sociais.

O evento, que foi mediado pela secretária-geral adjunta da CUT, Maria Aparecida, contou ainda com a presença do secretário-geral da Confederação Nacional dos Metalúrgicos, que alertou para as novas dinâmicas de trabalho.

“No mundo, temos 3 bilhões de trabalhadores formais. Desses, 1 bilhão trabalham em profissões criadas nos últimos cinco anos”, explicou Cayres. Maria pediu atenção para a saúde dos sindicatos após as novas legislações.

“Em Portugal, a Reforma Trabalhista passou há cinco anos. Depois disso, os sindicatos tiveram que se reinventar para, pois o número de trabalhadores sindicalizados despencou”, encerrou a dirigente.

Raquel Varela demonstrou preocupação com a “crise global do capitalismo”. “Em alguns países da Europa, como Itália e Espanha, as pessoas chegam a sair da casa dos pais aos 40 anos, em média. Isso é preocupante, pois mostra que está cada vez mais difícil para o trabalhador alcançar a independência financeira.”

A professora, que também é presidenta da Associação Internacional Greve e Conflitos Sociais, pediu que haja solidariedade “prática e não de papel entre os trabalhadores”. Após o encontro, a Raquel conversou com o portal da CUT. Confira a entrevista na íntegra.

CUT: A senhora reconhece que há um avanço da direita no mundo?

Raquel Varela: Não sou tão pessimista assim. Não creio que haja uma direita organizada no mundo, acho muito precipitada essa análise. Veja a França, por exemplo, a maioria da classe trabalhadora industrial francesa, na eleição recente, absteve-se. Portanto, se isentaram do debate, não necessariamente foram para a direita. Porém, dentro dos que optaram por votar, a maioria votou na extrema-direita, mas eles não são a maioria do povo francês. Nos EUA, apesar do Trump, tivemos o Bernie Sanders, candidato mais à esquerda, indo longe como nunca um homem de esquerda havia ousado nos EUA. Pelo mundo, temos o surgimento do Syrisa (Grécia) e do Podemos (Espanha), dois partidos que estão à esquerda e tiveram importante votações em seus países.

CUT: A esquerda, em sua opinião…

RV: A esquerda está derrotada e segue perdendo, inclusive no Brasil. A esquerda não apresenta projetos alternativos ao capitalismo, apenas modelos que se sustentam dentro do capitalismo.

CUT: E qual o papel dos sindicatos nesta conjuntura?

RV: Os sindicatos são organizações fundamentais, somente organizados e reunidos os trabalhadores conseguem ter força, isso é óbvio. Porém, se os sindicatos não souberem se renovar para combater as reformas trabalhistas pelo mundo, se não conseguem constituir bons fundos de greve, se não conseguem convencer suas bases de que precisam fazer greves, inclusive greves em escala global, para apoiar os trabalhadores de outros países, não vão conseguir sobreviver.

CUT: A senhora falou de “solideriedade prática” durante a conferência, poderia explicar melhor?

RV: A solidariedade dos sindicatos hoje tende a ser de papel, não de prática. A solidariedade de prática prevê que os trabalhadores que possuem estabilidade se unam e cooperem com os trabalhadores precarizados, inclusive organizando um fundo de greve que pague o salário desses precarizados enquanto eles estão de greve. Não pode ser uma solidariedade de palavras apenas, como temos visto.

CUT: Se fala em “latinoamericanização” do mundo do trabalho europeu. O que a senhora pensa disso?

RV: Não há “latinoamericanização” dos trabalhadores da Europa. É um absurdo essa comparação que está se espalhando na Europa. Lá na Europa, os trabalhadores ganham o suficiente para garantir sua qualidade de vida, mesmo diante da crise. No Brasil não, há uma situação terrível da classe trabalhadora. A flexibilização das leis trabalhistas no Brasil será terrível, não podemos comparar com o que há na Europa. A miséria vista no Brasil e outros países sul-americanos não pode ser comparada com o que vemos nos países europeus, por isso essa comparação é desrespeitosa.

CUT: Outra observação feita durante a conferência foi sobre a comunicação. A senhora entende que os sindicatos pecam nesse setor?

RV: Com certeza. Os sindicatos investem em sistema jurídico e funcionários. É um erro. O que as elites e os grandes patrões fazem com seu dinheiro para garantir que ele continue se multiplicando? Publicidade com seus jornais, cinemas e televisões. Os sindicatos precisam entender que no tempo de hoje não há como sobreviver sem investir em comunicação e publicidade.

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